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Rotinas e rastros geolocalizados: coletar, prever, sugerir

Qual o futuro dos dados georreferenciados? Será possível fazer previsões sobre como serão utilizadas tecnologias e serviços baseados em localização? O que está reservado é senão um mundo de automatismos e previsibilidades cujas funcionalidades estão deliberadamente assentadas sobre nossos dados privados?

Esse post do Écrans, site pertencente ao jornal francês Libération, começa com uma instigante consideração hipotética: estaríamos numa sexta qualquer de maio de 2015 e, tão logo estivéssemos indo ao trabalho, receberíamos um alerta no smartphone avisando sobre panes elétricas no metrô, justamente naquela linha que usamos todos os dias. Não bastasse o aviso, o celular, provando que realmente é smart, capta sua localização momentânea e propõe rotas alternativas para seu destino final – julgando, pois, que você irá aonde vai todos os dias úteis naquele horário.

O cenário pode parecer, por ora, um tanto assustador – como a máquina sabe tanto sobre seu próprio dono? Mas a longo prazo, e a despeito de futurologias bastante anuviadas, em alguma medida talvez seja algo assim que teremos a nosso dispor. Atualmente, diz o post do Écrans, os principais serviços de geolocalização – como o americano Foursquare e o francês Dismoioù (junção de Dis moi où, ou Diga-me onde) – trabalham basicamente com a ideia de lugares identificados num mapa (o que, de certa forma, é uma visão estreita do fenômeno, desprezando, por exemplo, aspectos de sociabilidade ou utilidade para o dia a dia).

Foursquare e Dismoioù: diz-me onde estás e te direi quem és.

Está bem demarcado que, nesses casos, a principal utilização gira em torno daquilo que o usuário posta deliberadamente. O funcionamento dessas redes, por ora, está amplamente baseado nos dados fornecidos voluntariamente pelas pessoas, especificamente os relativos à localização. No entanto, já é possível perceber um movimento ao contrário: ao invés de apenas coletar rastros, trajetórias, itinerários e rotinas, tais serviços já procuram sugerir alguns “desvios” para seus usuários – é o caso da opção Explore, do Foursquare, que exibe lugares de possível interesse para o utilizador, tendo por base sua localização momentânea.

Colaboração e cidadania: há lugar para elas?

Nem só de diversão e facilidades parece se constituir o futuro da geolocalização, entretanto. É importante perceber como tais tecnologias podem prover situações de mobilização social. É o caso dos diversos Twitter de Lei Seca ou do Waze, serviço de mapeamento de problemas no trânsito baseado em crowdsourcing – ou seja, os dados são providos por pessoas comuns, não por especialistas em gerenciamento urbano, por exemplo. Ressaltaria também outros exemplos de cartografias coletivas, como Urbanias ou WikiCrimes, dentre outras que analisei em minha dissertação de mestrado, sob a orientação de André Lemos.

No Waze, as informações sobre o trânsito são dados pelos próprios usuários.

Em meio à sociabilidade, diversão, utilitarismo e possíveis perdas de privacidade, por ora podemos estar certo de pelo menos uma coisa: as tecnologias de geolocalização estão definitivamente migrando para onde realmente devem estar – dispositivos móveis, como celulares e tablets, e não apenas situadas em ambientes web. É justamente no aqui e agora das situações (ou, de um modo mais informal, no calor do momento) que os dados situados temporal e geograficamente ganham sentido – seja em relação ao onde estou ou ao aonde ir.